Pós-Obra: O piso mal se assentou e o cliente já ligou

Confira o que você encontrará neste artigo:

1- Tipos de prazos de garantia;
2- Tipos de vícios/defeitos;
3- Situações que não englobam a garantia;
4- Como criar provas e se proteger.

Ah, a temida garantia no pós obra.

Imagina só, você constrói a casa dos sonhos de alguém, e quando tudo parece perfeito, surge a garantia no pós-obra para colocar um sorrisinho no rosto dos clientes e areia nos seus olhos. Isso porque muitas das vezes o cliente acredita que qualquer risquinho é motivo para culpar a construtora.

Sem falar na ansiedade de não saber se alguém vai acionar a construtora após anos da entrega do imóvel – lembre-se que a garantia legal é de incríveis 10 anos. Entregar a obra no prazo já é um desafio, agora imagine se você tiver que ficar movimentando sua mão de obra para consertar a casa de um ex-cliente.

Puxe a cadeira construtor, porque vou te contar como você pode evitar carregar um peso que não é seu.

1-  MAS VEJA BEM… É CONSTRUÇÃO OU REFORMA?

A primeira coisa que você deve analisar é: se foi uma empreitada total (da fundação ao acabamento) ou uma empreitada parcial (reforma, reaproveitamento de estruturas).

            Isso porque a construtora não pode se responsabilizar por construções que não edificou. Então, no caso de uma reforma, é preciso ser feito um laudo extremamente detalhista para demonstrar como era o imóvel antes e depois de sua intervenção.

            Além disso, o contrato precisa deixar claro que o dono da obra foi avisado de quaisquer problemas existentes na estrutura ou até mesmo possíveis vícios que o construtor não consegue detectar sem destruir a alvenaria, ou sem um laudo topográfico.

            Basicamente é “O abacaxi é seu, você quem descasque.”

            Empresário, lembre-se, para você não é sobre ter direito. E sim sobre ter provas.

            A justiça vai proteger o consumidor a ponto de exigir que você quem prove não ter responsabilidade pelo eventual defeito que o cliente diz ser da sua autoria.

            Sério, em um processo milionário, você quer ter se preparado com documentos para se defender. Entre a sua palavra e a do dono da obra, é como se a construtora lutasse com um martelo contra uma escavadeira.

2-  O QUE É CONSIDERADO DEFEITO/VÍCIO?

Vício é qualquer problema no imóvel que o torne menos valioso ou o impeça de ser usado como deveria. A garantia nada mais é do que um “prazo de observação” para surgimento desses defeitos. Pelo Código de Defesa do Consumidor, em regra, a empresa é considerada culpada, pois a lei entende que é parte do risco que ela assume ao fazer negócios na construção. Para quebrar esse entendimento, é necessário ter provas fortes. Muitas.

3-         TIPOS DE VÍCIOS

Para o direito, existem 03 tipos de vícios:

Redibitórios

Diz respeito à segurança e solidez da estrutura, incluindo salubridade. Não se trata apenas do colapso do prédio, mas também de qualquer problema que represente risco ou afete as condições adequadas de moradia/uso regular (ex: infiltração), tornando a obra imprestável para o uso.
AparentesSão aquelas de fácil constatação, constatados a olho nu. ex: mal acabamento, ausência de desnível no box do banheiro, sanitário descolado, dentre outros…
OcultosDemais vícios que se manifestam com o tempo e uso, ou que não podem ser detectados por leigos.Ex: Vaso sanitário descolando.

4-  TIPOS DE PRAZOS

Ok, mas então por quanto tempo fico refém de garantir a obra?

Bem, essa é a parte que gera bastante confusão tanto para o construtor, quanto para o dono da obra. Mas depois dessa leitura, só não pode o empresário aceitar qualquer reclamação de vício por não saber seus direitos.

Existem dois tipos de prazos: I- Para aparecer o defeito; II- Para reclamar/acionar a construtora.

Quanto ao prazo para reclamar – Código Civil – Art. 618    

Se tratando de vícios redibitórios: Haverá o prazo de 05 anos a partir da entrega para aparecer algum vício.Aparecendo algum defeito nesse intervalo, começaráa correr o prazo de180 dias desde a descoberta do defeito para pedir resolução do contrato ou abatimento no preço.

Exemplo: Então, se o vício é constatado após quatro anos e dez meses da entrega, o dono da obra terá o prazo de 180 dias a partir de então para reclamar, apesar de, no total, superar os 05 anos.

Não se iluda!

O prazo de garantia não é perdido pela venda do imóvel. O terceiro adquirente passa a ter direito sobre o que restou do prazo de garantia. Ou seja, se em 03 anos de recebimento da obra, Seu João vende o imóvel para a Dona Maria, ela terá os 02 anos restantes de prazo para acionar a construtora. É como se a garantida fosse transferida junto com a propriedade.

Mas nem venha hein, o prazo não reinicia!

Lembre-se: prazo de garantia é da obra e não da pessoa.

Quanto ao prazo para reclamar – Código De Defesa Do Consumidor

Quando a pessoa que contratar a construtora for o destinatário final, ou seja, quando construir/reformar para seu uso próprio, fica configurada a relação de consumidor. Nesse cenário será observado os seguintes prazos para reclamar:

  • Vícios Aparentes: São 90 dias para reclamar os vícios, contados da entrega da obra.
  • Vícios Ocultos: São 90 dias contados da descoberta do defeito para reclamá-los.

            Para evitar a alegação de vícios aparentes, é interessante fazer um “Termo de Entrega de Obra”. Afinal, não é incomum ver clientes afirmando que a construtora não seguiu o padrão contratado.

Então seguindo a lógica de criar provas, este documento servirá para demonstrar que na data da entrega das chaves – momento que se inicia o prazo de vícios aparentes -, o dono teve a oportunidade de verificar tudo no imóvel e aceitou do jeito que estava. Não podendo alegar que a construtora fugiu dos padrões combinados.

E ainda, se o dono da obra perder o prazo de vícios aparentes e querer ser espertinho alegando que a “rachadura apareceu depois”, este termo será uma prova a seu favor que na época da entrega, não existiam imperfeições.

ATENÇÃO: Entrega da obra é a partir da entrega de chaves e não a data do habite-se.

PRAZO PARA ENTRAR COM AÇÃO

O prazo para processar é uma sombra assustadora que paira sobre os empresários, despertando temor e apreensão.  É válido reforçar que o bom  empresário deve atentar-se ao seguinte: Caso a construtora seja acionada e não resolva o problema, o dono da obra poderá ingressar com ação no prazo de 10 anos.

PRAZOS NBR 17170

Poxa, 05 anos, 10 anos? São prazos muito longos!

Pensando na razoabilidade, a NBR 17170 – Tabela 2 veio para salvar a pátria. Ao falar de vícios ocultos ou aparentes de outros componentes da obra, esta norma se preocupou em estipular prazos condizentes com cada elemento da obra. Veja alguns exemplos:

Figura 1 – NBR 1717

Infelizmente, ainda não é corriqueiro que os tribunais julguem usando essa norma como base. Mas sem dúvidas é um ótimo argumento de defesa.

Isso porque no judiciário, quando a briga envolve divergência técnica como:

  • “seus meninos não sabem trabalhar!”
  • “você quem mexeu na obra depois!”

O juiz, por não entender sobre construção civil, solicita uma perícia feita por um engenheiro civil capacitado. E, por lógica, esperamos que o bom profissional vá se basear nas Normas Técnicas.

Além disso, a justiça pode ser convencida pela própria NBR 17170, que por se tratar de um documento de uniformização de normas, o juiz poderá chegar a conclusão que é coerente segui-la.

5-  NÃO É RESPONSABILIDADE DA CONSTRUTORA

A construtora não é responsável por vícios oriundos de coisas alheias à sua vontade e/ou técnica, como por exemplo os danos que surgiram por conta de uma tempestade. Afinal, a empresa trabalha com mestre de obras e não mestre dos magos.

            Além disso, o uso indevido pelo dono também não está dentro da garantia. Mas para isso, recomenda-se que a construtora forneça um manual do proprietário.

Lembra do que falamos? Tudo é prova.

E o maior argumento é “Eu não tinha como saber, afinal, não sou construtor”.

Para combater isso, o manual do proprietário é um enorme aliado. Quando a construtora fornece esse documento – e, claro, colhe assinatura de recebimento -, cria-se uma prova fortíssima que o proprietário tinha plena ciência de como cuidar de sua casa. O que pode, o que deve e até mesmo como deve.

A partir disso, voltamos ao “o limão é seu, você quem esprema”. Ora, se o proprietário sabia tudo isso, tinha acesso a todas as informações necessárias, qual o sentido de exigir que a construtora repare algo que ele mesmo fez conscientemente?

Veja, imagine que no manual do proprietário tenha um tópico explicando que não poderia ser usado certos produtos de limpeza no porcelanato, pois alguns componentes químicos podem manchar o piso.

Por sua vez, o proprietário ignora essa recomendação e faz um caldeirão de misturas para obter a poção “mágica” de limpeza.

É tiro e queda. O piso mancha, o dono da obra entra em crise e o construtor perde mais fios de cabelos.

Em eventual ação judicial ou notificação extrajudicial do cliente procurando que a construtora resolva a situação, a mera apresentação do Manual do Proprietário já pode libertar a empresa desta responsabilidade.

 Não se atentar para as questões jurídicas, especialmente quanto à garantia de uma obra, é como depender de um andaime frágil, cuja sustentação é incerta e pode desabar sob o peso de infortúnios ou clientes inquietos Só é possível prevenir aquilo que se pode prever.

PARA SALVAR NO CELULAR – RESUMO:

1- Se for reforma, a construtora só responde pela parte que edificou;

2- Vício é qualquer defeito que inutilize ou impeça o uso do imóvel para a destinação pretendida.

Tipos de vícios:

I- Oculto: Aparece com o tempo.

II-Aparente: Constatação imediata a olho nu.

III- Redibitório: Que prejudique a estrutura e a segurança da obra.

3- Garantia é o prazo de observação para assegurar que não haja vícios.

4- A construtora não responde por prejuízos causados pela natureza ou danos causados por terceiros, após a entrega da obra.

5- Existem 2 tipos de prazos: I- Para surgir o defeito; II- Para acionar a construtora.

VícioPrazo para reclamarA partir:
Redibitório180 dias (desde que dentro dos 05 anos de garantia)Da constatação do vício
Oculto90 diasDa constatação do vício
Aparente90 diasDa entrega das chaves

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